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Falando em música

Cibele Ambrozzi Corrêa
Colunista do blog

Mitos e lendas IV 

Hoje, terei o prazer de escrever sobre uma mulher de alma e essência negra disfarçadas em um corpo pálido, dona de uma voz áspera e insuperável, assim como foi seu estilo de vida, melhor cantora branca de R&B que se destacou nos anos 60 e seguiu conquistando gerações, Janis Lynn Joplin, ou melhor, Janis Joplin. Nascida no dia 19 de janeiro de 1943, na cidade de Port Arthur, Texas, cresceu ouvindo feras do blues, como Bessie Smith e Big Mama Thornton, inserida na cultura negra musical e a favor da integração racial na sociedade, sofreu com os preconceitos em plena tensão racial da época. 
Enquanto suas colegas de infância estudavam, Janis, aos 17 anos, se aventurava viajando de carona em carona, cantando nos bares em troca de bebida, bebeu em toda sua carreira, inclusive sua bebida favorita era o uísque Southern Comfort. Em 63 Janis se mudou do Texas para San Francisco, e por volta desta época aumentou seu consumo de drogas, não tanto as alucinógenas, pois dizia que a faziam pensar demais, mas as estimulantes, como a heroína, anfetaminas e o álcool. Sua saúde foi ficando debilitada pelo uso excessivo dessas drogas e decidiu voltar para sua terra natal para tentar se restabelecer. Em 1966, após um período de recuperação, ela retorna para San Fransisco e acaba se aproximando do grupo, do qual fez parte, “Big Brother & The Holding Company”, a banda assinou contrato com Mainstream Records gravando um álbum em 67. 
A repercussão não foi tão positiva com os primeiros singles, mas tiveram um grande destaque no Monterey Pop Festival, com uma versão da música “Ball and Chain”, curte no vídeo a cara da Mama Cass Elliot assistindo de boca aberta a apresentação da nossa diva. (http://www.youtube.com/watch?v=F-PwrR-tLqw). 
Em 68, estourou a música “Piece of my Heart” com o album “Cheap Thrills” que foi o seu maior sucesso, no fim deste mesmo ano, Janis se separa da banda Big Brothes, formando um novo grupo, os “Kozmic Blues Band” que fizeram presença no Woodstock Festival (http://www.youtube.com/watch?v=dBJnoMP1Uyc). 
Um ano depois gravaram um novo álbum chamado “I Got Dem Ol’ Kozmic Blues Again Mama”, rendendo um disco de ouro, mas nem perto do sucesso que foi o “Cheap Thrills”. 
Joplin formou outro grupo, o “Full Tilt Boogie Band”, esse resultou no álbum “Pearl” lançado em 1971, um ano após sua morte, tendo como os principais singles, o “Me and Bobby McGee”, composta pelo ex-namorado da cantora chamado Kris Kristofferson (1970) e “Mercedez Benz”. 
Só a titulo de curiosidade, a nossa pequena Janis também já foi parar na cadeia, foi em novembro de 1969, em Curtis Hixon Hall, em Tampa, na Flórida, depois de um show, foi acusada de usar frases indecentes e de desordem, dizem que durante a trajetória até a delegacia teria ofendido os policiais que a levavam. As acusações contra a cantora foram retiradas após avaliação e consideradas exercício da liberdade de expressão! 
Nossa diva morreu com seus 27 aninhos, que aliás, ô idadezinha amaldiçoada essa que leva sempre os melhores, já imaginou a festa que rola no céu (ou em outro lugar né, vai saber..rsrs) com essas figuras?! Jim Morrison, Jimi Hendrix, Brian Jones, certamente falarei sobre isso em uma próxima edição. Mas o que talvez poucos saibam, é que 8 meses antes de morrer, Janis esteve no Brasil curtindo o carnaval do Rio de Janeiro e tentando dar um tempo com a heroína, que naquela época não havia por aqui. Neste período ela se envolveu com o cantor Serguei e conheceu o fotógrafo Rick Ferreira, este, exatamente no momento em que foi expulsa do hotel Copacabana Palace por nadar nua na piscina, em uma entrevista à revista Trip ele afirma: “Quando a vi, ela estava chorando. Tinha acabado de ser expulsa do Copacabana Palace (por ter nadado nua na piscina). Era Carnaval e não havia hotéis disponíveis, ela não sabia pra onde ir. Convidei-a para vir para minha casa, um quarto-e-sala simples no Leblon. Ela aceitou na hora. Aí, começou um delírio total de drogas, álcool, de tudo...” 
“Ela levantava e já tomava uma garrafa de um litro de licor de ovos Dubar, uma coisa grossa e enjoativa. Aí, mandava umas pílulas. Lá pelo meio-dia, entrava no Fogo Paulista (tipo de cachaça industrializada). Daquilo iam garrafas… uns três litros. Depois, íamos à praia, a garrafa junto. Fomos muito à praia da Macumba (Recreio dos Bandeirantes). Em plena ditadura, 1970, ela fazia topless. Não deu outra: saímos da praia presos por atentado ao pudor. Depois, o velho jeitinho brasileiro ajudou a nos liberar.” 
O fotógrafo relatou que Janis não gostava de ir a lugares da moda, então numa de suas noitadas no Rio, ele a levou em um inferninho, com direito a prostitutas, marinheiros e gringos, lá estava Serguei, que a reconheceu na hora e mandou a música parar e exclamou: "senhoras e senhores, estamos com a maior cantora de todos os tempos" chamando-a para o palco, ela pediu que parassem de tocar e fez um show a capela, dá pra imaginar o espetáculo que deve ter sido né?! 
Serguei falou em uma entrevista que a conheceu em 1968, em um Festival que teve nos Estados Unidos e que foi convidado para ir para sua casa em San Francisco, ficou um mês hospedado lá. Ele relatou que um dia atendeu a porta e viu um black power todo jeitoso, nada mais, nada menos que Jimi Hendrix, outro dia em uma festa que rolou num motel, conheceu Jim Morrison e Kris Kristofersson. Em 1970, ele voltou a reencontrá-la no Brasil, conta que ela estava acompanhada por David Niehaus, um americano que ela conheceu no Brasil e conforme a biografia feita por Laura Joplin, sua irmã, ele teria sido seu grande amor. Certa ocasião, os três teriam ido até a praia e transado até o amanhecer. David, teria aguentado todas as atitudes de Janis até o uso de drogas, mas não suportou sua falta de sensibilidade com relação às loucuras sexuais. Mas o amor deles não acabou ali e o relacionamento continuou por cartas e telefonemas. 
Em uma entrevista dada para a revista Rolling Stone, Janis fala sobre sua viagem ao Brasil: “Se você tem cabelo comprido, te expulsam de um lugar e nunca deixam entrar. Os tiras estupram as pessoas, colocam cães no saco dos caras. O melhor mesmo foram umas noites em que cantei com uns amigos num puteiro.”. 
Última carta em que Janis escreveu, ela comenta sobre seu encontro no Brasil: “Realmente trabalhando demais nos ensaios, tenho uma nova (dois dos mesmos caras, três novos) pequena banda & tudo vai fantasticamente! Ótimas novas canções - eu realmente precisava de novas canções -, portanto faremos um disco durante a próxima turnê. Albert (o empresário) está aliviando minha agenda, um pouco devido à minha velha idade & porque eu pisei fundo demais! Dois meses na estrada, dois meses fora, dois na, dois fora etc. Encontrei um homem muito legal no Rio de Janeiro, mas eu tive que voltar a trabalhar, por isto ele está fora, descobrindo o resto do mundo - África ou Marrocos agora, eu penso, mas ele realmente me amou & foi tão bom para mim & ele quer voltar & casar comigo! Eu pensava que morreria sem alguém além dos fãs me chamando. Mas ele foi jeitoso & quem sabe - eu posso cansar do negócio da música, mas estou realmente fundo nela agora!” 
Como que prevendo sua morte, Janis resolveu refazer seu testamento 3 dias antes de morrer, no dia 1 de outubro daquele ano, sendo que no testamento anterior constava que todos seus bens ficaria para seu irmão Michael, no atual, deixou metade para seus pais e o restante a ser repartido entre seus irmãos e os amigos, reservando dois mil e quinhentos dólares para uma festa no dia da sua morte. 
Em um domingo do dia 4 de outubro de 1970, Janis estava hospedada no Landmark Motor Hotel, seu amigo John Cooke, a pedido do produtor Paul A. Rothchild, foi verificar o porquê do atraso da cantora para mais uma gravação, chegando no hotel ele avistou o carro dela na garagem, um Porsche 365c 1965 (pintado pelo seu amigo Dave Richards) e as cortinas do quarto fechadas, após bater algumas vezes na porta e ninguém atender, ele pediu autorização ao dono do hotel para entrar no quarto, assim que entraram se depararam com o corpo da cantora atirado de bruço no chão e em uma das mãos um valor de U$4,50, algumas fontes afirmam que Janis, após ter injetado heroína, teria falado com uma camareira e trocado uma nota de U$5,00 para comprar cigarros. Estava com a boca ensangüentada e o nariz quebrado, possivelmente devido a queda. A polícia foi chamada, o quarto vasculhado, a seringa usada por ela estava guardada, o que não era de costume pois sempre deixava na cabeceira, talvez fosse até um indicativo de que seria a última vez que faria. Conforme o laudo médico, a cantora teria injetado por acidente heroína bruta, limpa mesmo, que transforma a droga em morfina no organismo e tem efeito não imediato, mas fatal. 
Em sua biografia “Com amor, Janis Joplin” (assim que Janis assinava suas cartas enviadas à família) sua irmã, Laura, diz que não teria ela morrido por excesso de heroína, mas por irresponsabilidade e ganância do seu fornecedor que não verificou aquela remessa, pois ela tomava o cuidado de comprar a “mercadoria” sempre do mesmo por ser manipulada por um químico, e aquele lote estava sem depuração química nenhuma, vários consumidores do mesmo fornecedor morreram do mesmo jeito no mesmo dia. 
Janis Joplin, assim como Bessie Smith e Billie Holiday, sofreu muito com o chauvinismo da época ao desafiar o mundo machista da música, por viver intensamente cada momento. Alguns até a consideravam uma mulher de alma perturbada, como cita a autora do livro “Mulheres Que Correm Com Os Lobos”, que talvez para compensar isso tenha se entregado para as drogas, se foi este o motivo ou não, o certo é que ela nos presenteou não somente com uma bela voz, mas também com quebras de paradigmas e preconceitos que vigoravam e que de certa forma ainda vigoram, foi graças a mulheres como ela que hoje podemos provar que uma alma feminina pode se tornar e se tornou uma das maiores inspirações do rock. 

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